Minha experiência: a importância da mentoria feminina no mundo tech (e em qualquer área)

Isabella Barroso
5 min readJul 14, 2015

Três anos atrás eu deixei minha carreira na área de comunicação social. Finalmente eu tinha descoberto o que eu queria fazer da vida: programar e construir coisas, criar. No alto dos meus 25 anos.

Por que levei tanto tempo para descobrir isso? Vem comigo que eu te explico, juro que a viagem vai justificar também o título lá de cima.

Em primeiro lugar, devo dizer que ninguém na minha família trabalha, trabalhou ou conhece alguém da indústria de tecnologia, o meu contato com computadores veio de TV, filmes e da escola, apenas. Quando meus irmãos e eu ganhamos o primeiro computador, em 1995 me lembro da emoção e daquele sentimento de que tudo agora era possível.

De repente eu estava em um mundo que fazia sentido para mim, onde eu poderia ler todos os dias sobre as coisas que eu não tinha acesso no mundo real. Onde eu lia tutoriais, criava coisas e fazia parte de comunidades. Pela primeira vez eu não estava sozinha no meu modo de ver o mundo.

O som daquela conexão discada ainda faz meu coração bater rápido. Viaja no tempo e dá play no vídeo abaixo. Ah… delicia.

Eu cresci navegando na Internet, construindo sites no jurássico Geocities e HPG, jogava DOOM II, Duke Nukem 3D e baixava tudo no Napster, Kazaa e Soulseek (foram morrendo aos poucos e dando lugar ao torrent). ICQ era a norma. Email no Bol e tudo o mais. Eu me cerquei das maravilhas da internet. Era um mundo mágico do qual eu fazia parte.

Avançando alguns anos para ninguém morrer de tédio. Chegamos naquele momento decisivo de ter que escolher um curso na faculdade. Só de pensar nisso já me dá uma crise de ansiedade e três espinhas nascem. Bom, eu escolhi Jornalismo. (Onde é que isto vai dar? Você deve estar se perguntando).

O fato é que eu nunca pensei em escolher Ciência da Computação ou qualquer outro curso na área de tecnologia. Por que diabos não, né? Eu faço sites desde que eu tinha 13 anos, o filme Hackers era um dos meus favoritos (ainda é) e eu cresci sabendo um pouco sobre esse mundo… então por que é que eu nunca, nunca mesmo considerei isso como uma carreira, como o meu futuro? Nem como zueira…?

Hoje, com a sabedoria e distância daqueles anos eu sei o porquê. Eu não me identificava com aquele mundo.

NUNCA. TINHA.VISTO.UMA. MULHER. DA.ÁREA.DE.TECNOLOGIA.

Eu não podia me imaginar, nem mesmo em sonho, como sendo parte deste mundo profissionalmente.

Eu não me encaixava em nenhuma imagem pre concebida naquela época do que era ser um desenvolvedor de software e como ele deveria se parecer. Que era como um cara. Um cara nerd. E mesmo quando apareciam mulheres programadoras (hackers, na verdade) o exemplo era surreal: apenas, Angelina Jolie. Lide com isso.

Assim como tudo na vida, tive que passar por uma experiência para mudar as coisas. Terminei o curso de Jornalismo, e daí eu já estava trabalhando com mídia social, marketing e métricas. Foi quando consegui um estágio nos EUA. E minha jornada começou.

Apresento a vocês: minha mentora

Eu estava há alguns meses trabalhando pelas terras do Obama com a minha chefe incrível chamada Morgan Joy. E me dei conta que pela primeira vez na minha vida eu tinha uma mentora, um exemplo profissional. Se ela um dia ler este texto vai rir deste negócio de mentora, simples assim.

Pela primeira vez eu conheci uma mulher que trabalhava com tecnologia. E calhou que ela era um ser humano incrível e uma grande chefe. Ela sabia ouvir, compartilhar créditos sobre uma ideia, sabia como inspirar e dar apoio. E era foda, tecnicamente falando também. Ah, e ela estava grávida na época. Pois é.

Foi daí que as coisas fizeram sentido para mim. Uma mentora, uma mulher como modelo de vida profissional. Era isso que eu precisava para entender de verdade que aquilo era uma possibilidade. Que existem mulheres reais lá fora, que trabalham e programam e são fodas. E que eu poderia ser uma delas. Eu queria ser uma delas.

Quando meu estágio acabou e eu voltei ao Brasil, comecei um novo curso em Sistemas de Informação (a única forma que eu pensei que poderia entrar na indústria de tecnologia).

Fiz alguns estágios e finalmente comecei a programar. Na época, em Belo Horizonte, não existia nenhum grupo que apoiava mulheres na tecnologia. Então, comecei o grupo Women Who Code BH. Hoje temos outros, como a inicitiva Women Tech Makers do Google Developers Group e isto é lindo e tudo que eu sonhava, uma comunidade!

E porque eu sabia que não era o suficiente para ajudar outras meninas, fiz parte da organização de um programa-piloto em que dávamos aulas de programação para meninas carentes e foi uma experiência INCRÍVEL.

Tudo que eu queria era que elas soubesse que era possível, para que elas considerassem mesmo que por apenas um momento.

Para que aquelas meninas aprendessem ainda jovens o que eu aprendi quando eu tinha 25 anos. Que ser uma menina não limita o que você pode ser e fazer. Especialmente no campo da tecnologia.

Se alguma vez você tiver a oportunidade de ser mentora, por favor, seja. Porque eu garanto que há pelo menos uma menina lá fora, que nem sequer sabe que o que ela está procurando é por isto mesmo: você.

Para que você e suas experiências sirvam como um espelho que reflete a possibilidade de um futuro com o qual ela poderá se identificar. Por ser também mulher.

Para sempre eu irei agradecer esta mulher incrível que mudou a minha vida, apenas sendo quem ela é. E sigo por aí contando esta história para qualquer um que quiser ouvir e ler. Na esperança de mais mulheres aceitarem o desafio de se tornarem mentoras.

Ps: Hoje não trabalho mais diretamente programando. A vida me levou para o lado do produto, especificamente: Gerente de Produto (marketing + user experience + conhecimento dev.+ scrum + prototipagem + diplomacia) e na época mais esta transição fez sentido.

Links : )

Existem iniciativas fantásticas no mundo sobre isso. O empoderamento feminino e a mentoria. Aqui estão alguns links se você se interessar:

GlassBreakers — o propósito é de criar uma comunidade de mulheres que trabalham no mundo tech e que querem se conectar e ajudar.

Women Who Code — é uma organização sem fins lucrativos que se dedica a inspirar mulheres a buscar a excelência na carreira tecnológica e conectá-las. Dá uma olhada se já existe alguma comunidade na sua cidade, e quem sabe começar uma?

Aqui está: este mesmo texto, mas, em inglês.

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Isabella Barroso

Journalist. Independent Researcher. Used to build products with teams and now builds programs with communities.